Comecei a relembrar as matérias dos períodos anteriores, que tem conteúdos que vão cair na prova de Acadêmico Bolsista. Iniciando com “Sociologia e Antropologia da Nutrição”, só pra dar uma lida em transtornos alimentares.
Essa é uma temática muito interessante, mas é sempre difícil pensar em como o nutricionista pode contribuir num distúrbio que tem um fundo emocional e psicológico tão intenso. A verdade é que não estamos habilitados pra tratar disso. E só com a prática se pode identificar os casos...
E tudo isso provém de um paradoxo. Estamos num mundo muito diferente. A fome ainda é uma realidade em muitos países, mas se formos um pouquinho egoístas e olharmos um pouco pro nosso umbigo, sabemos que a desnutrição teve lá sua queda na América, especialmente no Brasil. No entanto, essa desnutrição não significa boa nutrição: ela vem sendo rapidamente substituída, e até sobreposta, pela obesidade. Isso tudo tem relação com fatores sócio econômicos e culturais. Para famílias mais pobres, é mais barato, ou parece ser, comprar biscoitos recheados, refrigerantes e salsichas pra se alimentar, do que o bom e velho arroz e feijão, acompanhado de algum vegetal. Claro que a ação midiática é certeira: os mais pobres querem ter acesso ao que todos tem: é questão de status. Eu lembro que uma vez uma professora minha disse que, numa pesquisa realizada por ela com mães de famílias com baixa renda, ao serem questionadas sobre o que comprariam para a alimentação dos filhos ser melhor, a resposta campeã foi: Danoninho. Como se fosse o melhor alimento da face da Terra. Puro status e propaganda.
Além desses símbolos dos símbolos de modernidade, como os restaurantes fast food, é notável a abundância de alimentos que temos atualmente. Não que esta abundância esteja igualmente distribuída pela população, longe disso. Mas se há mais oferta de alimentos, estamos incentivando o maior consumo de alimentos, certo?
NÃO, ERRADO! E você por acaso quer comer, engordar, e não parecer com as modelos de capas de revista?
É justamente esse o conflito que vivemos atualmente. E como as pessoas lidam com isso? É difícil, porque estamos no meio do fogo cruzado. Enquanto o Mc Donalds lança o seu novo sundae com mais calda e mais chocolate, daqueles que tem gordura trans até dizer chega, você se sente obrigada a ver o mais novo Globo Repórter que trate de alimentação e passar a seguir aquelas dicas pra tentar emagrecer. A política da magreza é imposta até àquelas pessoas que dizem não se importar com isso. Dizem.
Os transtornos alimentares tem aí, nessa confusão e nessa vontade de satisfazer a padrões, o seu terreno fértil. Claro que tem raízes e origens muito mais intimas e internas. Discute-se muito a função do aleitamento materno para o vinculo mãe-filho. A falta desse vinculo tem explicado muito sobre o que acontece no transtornos.
A família tem muito a ver com isso também. Até pelo perfil familiar é possível separar a possibilidade de se ter anorexia ou bulimia. Família superprotetoras, que incentivam a menina a ser a princesinha da casa, parecem retardar o desenvolvimento da autonomia da filha. Não comer faz parte de cortar esse cordão umbilical emocional. Já na bulimia, há sempre um familiar, ou a própria pessoa, que se cobra, ou é cobrado por ter que emagrecer; e geralmente a família tem estrutura mais desorganizada, sem horários nem limites.
Jean Baudrillard fala muito sobre a temática do corpo, e defende que agora, o corpo não é nada mais que “simulacro não real”, que passa a ter mais significado do que ele na verdade tem. É meio difícil de entender, mas é como se ele carregasse valores que aumentam o seu significado, por que na verdade não existe. Hoje, o corpo não é um complemento das qualidades pessoais de uma pessoa, ele é a pessoa. Por isso essa cobrança tão imensa para que o corpo seja tão perfeito quanto o padrão adotado como o perfeito.
“O conceito de beleza na verdade é virtual. Os indivíduos como seres sociais sentem-se pressionados a corresponder ao ‘padrão’ de beleza da sua cultura – que é exaustivamente apontado pela mídia -, caso contrário, sentem-se menos atraentes e inferiores. Algumas pessoas, nesse caminho, elegem o corpo como único representante de si mesmas e o controle do peso como forma de viver; não percebem o quão tirânica a beleza pode ser e, diante de um universo de possibilidades como ser humano, deixam de acreditar em si em nome de um modelo que será sempre inexistente (Roso, 1993)”
Alvarenga, Marle. A mudança na alimentação e no corpo ao longo do tempo. In: Transtornos Alimentares. p.16.
Achei esse trecho muito bonito mesmo. É triste ver como a nossa sociedade se ‘artificializa’ em cada detalhe, e o interior, o essencial (que é invisível aos olhos, como diz o Exupéry) fica sempre em segundo plano...
Bom, gostei dessa revisão! Quero ver quando chegar a vez de Microbiologia o/
Ouvindo: To whom it may concern, Lisa Marie Presley. Um som descompromissado, bão pra escrever...
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